16º Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade

Por Ana Paula Navarrete

Ao chegar ao Cine Livraria Cultura em São Paulo, na Paulista, é fácil notar o tumulto de pessoas em fila, ultrapassando a saída. Depois de um tempo de espera, você finalmente consegue chegar à bilheteria onde, supostamente, deve-se comprar o ingresso. Se tratando do 16º Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade, essa situação é substituída por outra muito melhor: entrada gratuita.

Todo ano, o Festival propõe unir cultura e entretenimento para a população. Os documentários são exibidos em vários pontos diferentes da cidade como o Cine Livraria Cultura, o Centro Cultural Banco do Brasil, a Cinemateca Brasileira, o Reserva Cultural, o Cinemark Eldorado e o Cinusp Paulo Emílio.

Simultaneamente às sessões paulistanas, ocorridas entre os dias 31 a 10 de abril, aconteceram exibições no Rio de Janeiro. Entre os dias 10 e l3, o Festival foi para Brasília e depois Recife. Este ano, o evento contou com sete documentários competindo na categoria longa e média metragem nacional, 18 na categoria curta metragem nacional e internacional, e 12 na categoria longa e média metragem internacional.

O vencedor da categoria nacional foi o longa Dois Tempos de Arthur Fontes e Dorrit Harazim. A história passa, literalmente, em dois tempos. O documentário traça o padrão da família de classe média brasileira, moradores da periferia de São Paulo, em dois períodos com diferença de 10 anos entre eles. Além da comicidade evidente, traço característico da família Braz, que foi retratada no filme, o filme aponta os avanços da classe média no país. Os jurados declararam que Dois Tempos “suscita reflexões construtivas, muito além dos sinais de progresso que o Brasil aponta”.

 O júri decidiu, por unanimidade, atribuir uma Menção Honrosa ao filme Aterro do Flamengo, de Alessandra Bergamaschi. Ao colocar uma câmera estática no parque Aterro do Flamengo, a diretora retrata as muitas reações da população ao se depararem com uma cena trágica. O júri alegou que “se trata de uma obra singular, que causa uma inquietação no espectador durante todo o tempo de projeção”.

A categoria internacional concedeu a vitória a You Don´t Like the Truth – (Você não gosta da verdade – 4 dias em Guantánamo) de Côté e Patricio Henriquez. Os diretores expuseram detalhes de 4 dias de interrogatório do jovem Ohmar Kadhr, prisioneiro de guerra canadense acusado de matar um norte americano. Cheio de cenas impactantes o longa mostra os maus tratos e a falta de diretos humanos com uma criança. O jurados alegaram que “Você Não Gosta da Verdade é uma denúncia cáustica do poder, o filme é um documentário de investigação na sua melhor forma”.

A menção honrosa foi dada ao longa Cinema Komunisto. O longa é um olhar bem-humorado e profundo de um capítulo negro na história da Iugoslávia, através do uso criativo de materiais de arquivo e depoimentos.
Os curtas vencedores foram Fora de Alcance de Jakub Stozek e A Poeira e o Vento de Marcos Pimentel.

O título “Fora de Alcance” é a chave que conduz e fecha a história do curta que apresenta a dramaticidade de uma reviravolta familiar, já A Poeira e o Vento conduz os espectadores ä imagens e recursos cinematográficos tão impressionantes, que tornam as palavras um mero acessório dispensável.

Nunca foi tão apresentada, na história do Festival, a imagem da palavra “liberdade” em seus muitos aspectos. Até de modo subentendido a temática da liberdade apareceu de maneira irreverente e surpreendente, na maioria dos documentários. No longa Onda verde e Black Power Mixtape, a liberdade política, racial e  de expressão, são a base da construção ideológica dos filmes. Até em Você não gosta da verdade, o direito da liberdade de vida e justiça, permeia o filme do começo ao fim.

Foram exibidos mais de 50 documentários, sendo alguns inéditos e outros apresentados em sessões especiais, com temas específicos. A homenageada desta edição foi a documentarista russa Marina Goldovskaya. A sessão de retrospectiva internacional exibiu 9 de seus documentários, entre eles O gosto amargo da liberdade (2010) e A casa da rua Arbat (1993).

Outro item memorável que vale a pena citar, além claro, do Festival conseguir arrecadar um público presente e grandioso, foi a 11ª Conferência do Documentário e os debates realizados durante o Festival. As sessões traziam mesas interessantíssimas, sempre regados de pessoas ilustres, como a própria Marina Goldvskaya, o jornalista Marcelo Tas, o cineasta Jean Claude Bernardet.

Se a idéia era discutir, exibir e estimular o documentário no Brasil, o Festival É Tudo Verdade conquista, a cada ano, mais e mais apaixonados pelo tema cumprindo assim, sua via crucis anual. Citando o próprio idealizador do Festival, Amir Labaki, quando utiliza brilhantemente Drummond para descrever a metáfora do Festival: "A porta da verdade estava aberta", diz ele “entrem”.



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